1954 - PEGASO Z-102 COMPETITION COUPE
O Pegaso Z-102 é um dos carros mais icônicos da história automotiva espanhola, um superesportivo que simbolizou a ambição e a engenhosidade da Pegaso, marca criada pela Empresa Nacional de Autocamiones S.A. (ENASA) em 1946. Lançado em 1951 sob a liderança do engenheiro Wifredo Ricart, o Z-102 foi concebido para competir com os gigantes da época, como Ferrari e Maserati, e elevar o prestígio da indústria espanhola no cenário global. Disponível nas versões coupé e cabriolet, o modelo combinava desempenho excepcional, design sofisticado e tecnologia avançada, tornando-se um marco, apesar de sua produção limitada.
Origem
No início dos anos 1950, a Espanha ainda se recuperava das cicatrizes da Guerra Civil (1936-1939) e enfrentava desafios econômicos sob o regime franquista. A Pegaso, inicialmente focada em caminhões e ônibus, viu no Z-102 uma oportunidade de demonstrar a capacidade técnica do país e criar um ícone de orgulho nacional. Wifredo Ricart, ex-engenheiro da Alfa Romeo e rival de Enzo Ferrari, trouxe sua experiência em competições e engenharia aeronáutica para projetar um carro que pudesse rivalizar com os melhores esportivos europeus. O Z-102, apresentado no Salão de Paris de 1951, foi uma declaração ousada: a Espanha podia construir máquinas de alto desempenho, mesmo em um contexto de recursos limitados.
O nome ‘Z-102’ reflete sua configuração técnica: ‘Z’ para os carros de passeio da Pegaso e ‘102’ para o motor V8 de 2.5 litros inicial. O carro foi produzido em duas carrocerias principais: coupé, com linhas elegantes e teto fixo, e cabriolet, com capota conversível, que oferecia uma experiência de condução ao ar livre. Ambas as versões eram voltadas para uma clientela de elite, incluindo nobres, celebridades e colecionadores, com preços que chegavam a 500 mil pesetas (equivalente a cerca de 15 mil euros na época).
Desenvolvimento e Características Técnicas
O Z-102 foi projetado com um chassi de aço soldado, leve e robusto, equipado com suspensão independente nas quatro rodas, um diferencial traseiro De Dion e freios a tambor de alta eficiência. Seu coração era o motor V8 de alumínio, uma obra-prima de Ricart, inicialmente com 2.5 litros e 165 cv, mas que evoluiu para versões de 2.8 litros (175-200 cv) e 3.2 litros (até 280 cv com compressor). A transmissão manual de 5 velocidades, montada na traseira para melhor distribuição de peso, permitia ao Z-102 atingir velocidades máximas de até 245 km/h, o que o tornou, em 1953, o carro de produção mais rápido do mundo.
A carroceria do Z-102 foi outro diferencial. Inicialmente projetada por Medardo Biolino, da ENASA, a produção foi terceirizada para encarroçadores renomados, como a italiana Carrozzeria Touring (para os coupés mais leves, em alumínio) e a francesa Saoutchik (para designs mais extravagantes, especialmente cabriolets). A versão coupé, com suas linhas fluidas e aerodinâmicas, era mais focada em desempenho e competições, enquanto o cabriolet, com capota retrátil de lona, apelava ao glamour e à exclusividade, atraindo compradores que buscavam sofisticação. Algumas unidades receberam carrocerias personalizadas, como o famoso ‘Thrill’ cabriolet da Saoutchik, com detalhes cromados e curvas dramáticas, apresentado no Salão de New York em 1953.
A produção artesanal do Z-102 garantia exclusividade, mas também limitava sua escala. Cada unidade era praticamente única, com variações em acabamento, motorização e detalhes estéticos. Entre 1951 e 1957, apenas 86 exemplares foram fabricados, sendo aproximadamente 60 coupés e 26 cabriolets, embora os números exatos variem segundo diferentes registros.
Participação em Competições
O Z-102 foi projetado com competições em mente, e a Pegaso investiu em sua participação em eventos internacionais para provar sua capacidade. A versão coupé, mais leve e aerodinâmica, era a preferida para corridas. O carro estreou no Grande Prêmio de Mônaco de 1952, onde, apesar de não vencer, impressionou pela engenhosidade. Em 1953, participou das 24 Horas de Le Mans, com um coupé pilotado por Juan Jover e Celso Fernández, mas problemas mecânicos forçaram o abandono. Na Carrera Panamericana de 1954, no México, o Z-102 enfrentou condições extremas, mas não obteve resultados expressivos devido a falhas técnicas e à inexperiência da equipe.
Apesar dos desafios nas pistas, o Z-102 demonstrou potencial notável. Modelos preparados para competição, como o Z-102 BS (Bissúper, com compressor), alcançavam desempenhos comparáveis aos de modelos da Ferrari e da Jaguar. A falta de recursos e uma rede de apoio limitada, no entanto, impediram a Pegaso de competir consistentemente no automobilismo.
Versões Notáveis
- Z-102 Coupé Touring: Produzido pela Carrozzeria Touring, este modelo usava a técnica ‘Superleggera’ (carroceria de alumínio sobre um esqueleto tubular), garantindo leveza e rigidez. Era o mais esportivo, com linhas limpas e minimalistas, ideal para competições.
- Z-102 Cabriolet Saoutchik: Conhecido por seu design opulento, com cromados abundantes e formas curvilíneas, este cabriolet era voltado para o mercado de luxo. O modelo ‘Thrill’ é um dos mais famosos, exibido em salões internacionais.
- Z-102 Spider Competizione: Uma variante do cabriolet preparada para corridas, com peso reduzido e motor mais potente, usada em eventos como Le Mans.
- Z-102 BSS (Bissúper): Equipado com compressor, disponível em ambas as carrocerias, oferecia até 280 cv e era o ápice do desempenho do modelo.
Declínio e Fim da Produção
Apesar de seu brilho técnico e estético, o Z-102 enfrentou obstáculos intransponíveis. Seu custo de produção era altíssimo, devido à construção artesanal e aos materiais importados, tornando-o inviável comercialmente em um mercado espanhol limitado. Além disso, o regime franquista, que inicialmente apoiou o projeto como símbolo de prestígio, passou a considerá-lo um luxo desnecessário frente às prioridades econômicas do país. Em 1958, a produção do Z-102 foi encerrada, junto com o Z-103, seu sucessor ainda mais raro. A Pegaso voltou a focar exclusivamente em veículos industriais, abandonando os carros esportivos.
Legado
O Pegaso Z-102, em suas versões coupé e cabriolet, permanece como um dos carros mais raros e desejados do mundo. Das 86 unidades produzidas, estima-se que menos de 50 ainda existam, muitas em museus (como o Museu da História Automobilística de Salamanca) ou coleções privadas. Os preços em leilões podem ultrapassar 1 milhão de euros, refletindo sua exclusividade e status de ícone. O coupé é celebrado por sua pureza técnica e desempenho, enquanto o cabriolet é admirado por seu charme e extravagância.
O Z-102 também simboliza a visão de Wifredo Ricart, que desafiou as limitações de sua época para criar um carro à altura dos melhores do mundo. A rivalidade com Enzo Ferrari, embora mais lendária do que prática, adiciona um toque de romantismo à sua história. Mais do que um veículo, o Z-102 é um testemunho da ousadia espanhola, um cavalo alado que voou alto, ainda que por pouco tempo.