A história da De La Chapelle é uma saga que combina tradição familiar, paixão por automóveis e um compromisso com a exclusividade artesanal. Fundada no início do século XX, a marca tem suas raízes na região de Loire, na França, e foi revitalizada na década de 1970 por Xavier de La Chapelle, um entusiasta determinado a resgatar o legado automotivo de sua família.
As Origens: Stimula e os Irmãos De La Chapelle
Tudo começou no final do século XIX, quando os irmãos Guy e Carl de La Chapelle, proprietários de um vinhedo em Borgonha, adquiriram um Mors 5hp em 1896 e um Rochet-Schneider em 1900. Apaixonados por mecânica, eles fundaram a marca De La Chapelle - Stimula para produzir motocicletas e triciclos motorizados. Com a colaboração de seus primos Neyrand, ferreiros da região de Loire, os irmãos expandiram para a fabricação de automóveis no início do século XX. A grade frontal de seus veículos, inspirada em uma ‘subida de colina’ - uma prova desafiadora da época - simbolizava a robustez e confiabilidade da marca.
A De La Chapelle destacou-se por projetar e fabricar seus próprios motores, uma raridade em uma era dominada por motores De Dion-Bouton. Seus carros, leves e robustos, conquistaram Paris, onde foi aberta uma agência na capital francesa. A empresa produziu cerca de mil veículos, um número impressionante para o período, e abriu um showroom em 1912 no Boulevard de Montparnasse. No entanto, a Primeira Guerra Mundial interrompeu as operações: Carl, o engenheiro, foi gravemente afetado por gases no front, e a empresa fechou em 1923.
A Renascença: Xavier de La Chapelle
Em 1975, Xavier de La Chapelle, sobrinho-neto de Guy e Carl, decidiu ressuscitar a marca aos 26 anos, movido pela mesma paixão por automóveis que seus antepassados. Baseado em Saint-Chamond, próximo a Lyon, Xavier fundou a moderna Automobiles De La Chapelle, focada em criar veículos exclusivos inspirados em clássicos, mas adaptados aos padrões modernos. Sua primeira criação foi o Type 55, uma evocação do icônico Bugatti Type 55 Roadster de 1932, projetado por Jean Bugatti. Apresentado no Salão de Genebra de 1978, o Type 55 usava um motor BMW de 6 cilindros (com modificações Alpina ou AC Schnitzer) e um chassi tubular moderno, combinando estética clássica com tecnologia contemporânea.
A qualidade do trabalho de Xavier conquistou reconhecimento oficial: em 1984, a Messier-Hispano-Bugatti autorizou o uso do emblema Bugatti na grade do Type 55, atestando que a De La Chapelle preservava o espírito dos modelos vintage da Bugatti. Essa permissão durou até 1989, quando Romano Artioli adquiriu a Bugatti para produzir o EB110.
Expansão e Diversificação
A De La Chapelle não se limitou a evocações de Bugatti. A empresa produziu modelos como o Type 55 Tourer (uma versão de quatro lugares para famílias), o Type 57S Atalante (um coupé elegante) e o Type 55 Grand Prix (voltado para competições). Além disso, criou as Les Juniors de la Chapelle, réplicas em escala 6/10 de modelos como o Bugatti 55, BMW 328 e Ferrari 330 P2, destinadas a jovens pilotos. Até 1981, cerca de 1.500 unidades dessas miniaturas foram vendidas globalmente, exibidas em museus e eventos como o Le Mans Classic.
Na década de 1980, a De La Chapelle produzia cerca de 15 carros por ano e 100 unidades das versões Junior, tornando-se uma empresa rentável. Em 1989, Xavier assumiu a direção da Venturi, outra marca francesa de carros esportivos, e liderou projetos ambiciosos. No Salão de Paris, apresentou o Parcours, um monovolume de luxo inovador equipado com motores V12 Jaguar ou V8 Mercedes-Benz, projetado para ser um ‘escritório sobre rodas’ para executivos. Apesar de sua visão pioneira, apenas três protótipos foram construídos devido à crise econômica de 1992 e à falência do principal investidor, Didier Primat.
O Roadster e a Aventura Indiana
Na década de 1990, a De La Chapelle lançou o Roadster, um conversível esportivo de dois lugares com motor central Peugeot (4 cilindros ou V6 de 210 cv). Apresentado no Salão de Genebra de 1998, o Roadster foi projetado para competir com modelos como a Mazda MX-5, mas com um toque artesanal. Um projeto ambicioso envolveu a produção do Roadster na Índia, com uma fábrica planejada em Bombaim. No entanto, a morte súbita do parceiro indiano interrompeu o projeto, marcando outro revés para a marca.
Desafios e Legado
A crise de 1992 e os altos custos do Parcours levaram a De La Chapelle a um concurso de credores em 1993. Xavier vendeu parte da empresa para Bertrand Barré, que concluiu dois pedidos pendentes de réplicas Bugatti e continuou o desenvolvimento do Roadster. Apesar das dificuldades, a produção artesanal persistiu, com a marca fabricando um ou dois carros por ano.
Hoje, a De La Chapelle permanece ativa, focada em veículos sob medida, como o Atalante V8 Série 6, um coupé de luxo inspirado nos clássicos franceses. Mais de cem carros inspirados em Bugatti, fabricados pela De La Chapelle, circulam pelo mundo, da França ao Japão, e o Clube De La Chapelle, fundado em 1987, reúne proprietários entusiastas para passeios e eventos. A marca também explora a mobilidade elétrica, com Xavier liderando projetos como uma navette autônoma.
Conclusão
A De La Chapelle é um exemplo raro de um pequeno fabricante que sobreviveu às adversidades, mantendo viva a tradição artesanal francesa. Sob a liderança de Xavier de La Chapelle, a marca combinou nostalgia com inovação, criando veículos que celebram a herança automotiva enquanto atendem às exigências modernas. Seja com suas evocações de Bugatti, o pioneiro Parcours ou o elegante Roadster, a De La Chapelle continua a ser sinônimo de exclusividade e paixão pelo automóvel.