HEALEY SILVERSTONE: VELOCIDADE E ESTILO NA ERA PÓS-GUERRA
O Healey Silverstone é um ícone dos veículos esportivos britânicos pós-Segunda Guerra Mundial, um carro que misturava a essência de uma máquina de corrida com a praticidade de um roadster acessível.
O Contexto Pós-Guerra e o Nascimento do Silverstone
A história do Healey Silverstone remonta ao final dos anos 1940, um período de reconstrução na Grã-Bretanha após a Segunda Guerra Mundial. Donald Healey, um engenheiro visionário, ex-piloto de rally e vencedor do Monte Carlo de 1931, fundou a Donald Healey Motor Company em 1945, em Warwick, Inglaterra. Inicialmente, a empresa produzia carros de alto desempenho como o Healey Elliott, um sedan esportivo equipado com motor Riley de 2.4 litros, que alcançava velocidades impressionantes para a época - mais de 160 km/h.
No entanto, o governo britânico dobrou o imposto de compra sobre automóveis acima de 1.000 libras esterlinas em 1948, saltando de 33% para 66%, o que encareceu os luxos automotivos. Healey, astuto, viu nisso uma oportunidade: criar um carro de alto desempenho por menos de 1.000 libras esterlinas, tornando-o acessível a entusiastas e ‘clubmen’ (amadores de corridas de clube). Assim nasceu o Silverstone, anunciado em julho de 1949 e batizado em homenagem ao icônico circuito de Silverstone, um dos primeiros traçados de corrida pós-guerra, simbolizando otimismo e velocidade.
O Silverstone não foi o primeiro nessa linha. Em 1947, o encarroçador Duncan Industries já havia criado o Healey Duncan Drone (apelidado de ‘Spiv’), um roadster simples sobre chassi Healey, vendido por menos de 1.000 libras esterlinas. Mas o Silverstone elevou o conceito, com um design aerodinâmico e foco em competições, descrito pela revista The Motor como um “modelo de dois lugares leve de tipo competição” por 975 libras esterlinas - abaixo do limite fiscal.
A produção total foi limitada a 105 unidades, entre 1949 e 1951, fabricadas à mão por uma equipe de apenas 40 funcionários. Isso era o mínimo para homologação em corridas de produção (100 unidades), e todos foram vendidos rapidamente. O carro pesava apenas 940 kg, com um chassi de seção em caixa reforçado com ‘X’ soldada, suspensão dianteira independente de braço oscilante (invenção de Healey) com molas helicoidais e barra estabilizadora, e suspensão traseira rígida com molas helicoidais e eixo Riley. Freios hidráulicos Lockheed e rodas de disco prateadas completavam o pacote.
O coração era o motor Riley ‘Big Four’ de 2.443 cm³, um 4 cilindros em linha com duplo comando de válvulas laterais (hemi-head), produzindo 104 cv a 4.500 rpm e torque de 200 Nm. Acoplado a uma transmissão manual de 4 velocidades, ele impulsionava o Silverstone a mais de 170 km/h e aceleração de 0 a 100 km/h em cerca de 11 segundos. O design do bodywork em alumínio, criado por Len Hodges, era minimalista e elegante: para-lamas de ciclo removíveis, faróis embutidos atrás da grade angular para aerodinâmica, para-brisa retrátil (que se abaixa parcialmente no painel para corridas) e estepe horizontal na traseira, funcionando como para-choque.
Sucesso nas Competições e no Mercado
O Silverstone era um ‘lobo em pele de cordeiro’: um carro de rua disfarçado de racer. Projetado para pistas, mas legal para estradas, ele brilhou em eventos como o Rally Alpine de 1949 (segundo lugar geral e de classe, pilotado por Donald Healey e Ian Appleyard), a Mille Miglia (vitória em classe), o Liège-Rome-Liège e corridas em Goodwood, Isle of Man e Silverstone. Futuras estrelas como Tony Brooks deram seus primeiros passos nele. Em 1950, variantes estendidas com motor Nash de 4.1 litros competiram em Le Mans, terminando em 5º (1950), 6º (1951) e 3º (1952).
No mercado, foi um sucesso entre colecionadores e corredores amadores. Um exemplo curioso: um estudante de odontologia convenceu a mãe a comprar um Silverstone (chassi D11) como ‘carro de compras’, mas o usou para dominar pistas locais. Outros foram convertidos, como um chassi nu equipado com V8 Cadillac por Briggs Cunningham para corridas nos EUA. Sua popularidade levou a conversões de outros Healeys em ‘Silverstones’.
As Versões: D-Type e E-Type
O Silverstone evoluiu rapidamente para atender demandas. Inicialmente, todos eram da versão D-Type (51 unidades, de julho de 1949 a abril de 1950), com carroceria estreita e cockpit apertado - ideal para pistas, mas desconfortável para pilotos maiores. Tinha assentos individuais, rodas de 16 polegadas e foco em leveza.
A grande mudança veio em 1950, graças ao piloto Duncan Hamilton, que achou o D-Type ‘curto demais’ para seu porte. Healey adaptou um exemplar para ele, criando a E-Type (54 unidades, de abril de 1950 a 1951). Essa versão era mais larga (corpo expandido para conforto), com banco contínuo esculpido em dois baldes, coluna de direção ajustável, capô com entrada de ar para admissão e rodas de 18 polegadas opcionais. O cockpit ganhou espaço, mas manteve a essência racer. Ambas as versões compartilhavam o motor Riley, mas o E-Type era mais versátil para uso misto.
Opções de fábrica incluíam supercharger Wade (para mais torque e flexibilidade, testado a 235 km/h) e cores como verde pálido, azul metálico ou vermelho. Após 1951, a produção parou para dar lugar ao Nash-Healey e, mais tarde, ao lendário Austin-Healey 100, mas o Silverstone pavimentou o caminho para o legado Healey.
Legado
Hoje, com apenas 105 exemplares, o Silverstone é raríssimo e valorizado - um E-Type restaurado pode ultrapassar 200.000 libras esterlinas em leilões. Muitos participam de eventos como Mille Miglia, VSCC e Goodwood Revival, preservando sua herança. Ele representa a era de ouro dos roadsters britânicos: simples, veloz e acessível, um contraponto aos gigantes como Jaguar XK.