Em um galpão discreto nos arredores de Turin, onde o aroma de argila de modelagem ainda paira no ar, nasceu uma das forças mais influentes da indústria automotiva mundial. A Italdesign Giugiaro S.p.A., fundada em 13 de fevereiro de 1968 por Giorgetto Giugiaro e Aldo Mantovani, revolucionou o conceito de ‘carro’ ao transformá-lo em arte funcional - e, por décadas, ditou tendências que rodaram de Tokyo a Detroit.
Giugiaro, já consagrado por desenhar o Alfa Romeo Giulia GT e o Iso Rivolta, deixou a Bertone em 1967 com a missão de criar uma empresa independente que unisse design, engenharia e prototipagem sob o mesmo teto. A Italdesign foi a primeira ‘one-stop shop’ do setor: esboços à mão, modelos em escala 1:1, testes de túnel de vento e até produção em pequena escala. O primeiro grande impacto veio em 1970, no Salão de Turin, com o concept Bizzarrini Manta - um wedge shape angular que antecipou a estética dos anos 70 e 80.
O golpe de mestre, porém, foi o Volkswagen Golf Mk1. Encomendado pela VW em 1972, o projeto typ 17 saiu das pranchetas da Italdesign em apenas 18 meses. Lançado em 1974, o hatch compacto vendeu mais de 35 milhões de unidades e salvou a Volkswagen da falência pós-Beetle. Giugiaro cunhou o termo ‘design democrático’: linhas limpas, espaço interno otimizado e produção em massa acessível. O Golf foi seguido por outros ícones de volume - FIAT Uno (1983), SEAT Ibiza (1984) e até o DeLorean DMC-12 (1981), cuja carroceria em aço inoxidável e portas gull-wing viraram cult.
Nos anos 80 e 90, a Italdesign expandiu-se para além do design. Criou plataformas modulares (a base do FIAT Panda, Uno, Lancia Y10 e SEAT Marbella usava a mesma arquitetura) e investiu em segurança ativa - o concept Lancia Megagamma (1978) antecipou as minivans modernas. A empresa também flertou com o luxo: Maserati 3200 GT, Ferrari GG50 e o BMW Nazca C2 foram exercícios de estilo que nunca entraram em produção em massa, mas influenciaram gerações de supercarros.
A virada do milênio trouxe desafios. A globalização intensificou a concorrência, e Giugiaro, aos 70 anos, buscou um parceiro estratégico. Em 2010, a Volkswagen adquiriu 90.1% da Italdesign, integrando-a ao seu império. Cinco anos depois, em 2015, Giorgetto e seu filho Fabrizio venderam os 9.9% restantes e deixaram a gestão operacional - mas não o legado. Sob o comando do Grupo VW, a Italdesign passou a desenvolver veículos elétricos e autônomos, como o concept Sedici (2019) e o projeto de mobilidade urbana Airbus Pop.Up.
Hoje, com mais de 900 funcionários e faturamento anual superior a 200 milhões de euros, a Italdesign projeta não apenas carros, mas soluções de mobilidade para marcas como Hyundai (concept Prophecy), Nissan (GT-R50) e até trens de alta velocidade para a chinesa CRRC. Seus arquivos guardam mais de 300 projetos realizados e 60 conceitos visionários - um acervo que vale mais que ouro para historiadores do design.
Em meio à eletrificação e à condução autônoma, a Italdesign segue fiel à máxima de Giugiaro: “O carro do futuro deve ser belo, funcional e acessível”. De um galpão em Moncalieri, a empresa italiana continua redesenhando o mundo sobre rodas - uma linha reta de cada vez.