A história da Th. Schneider, também conhecida como Automobiles Th. Schneider, é um capítulo fascinante do automobilismo francês, marcado por ambição, inovação e desafios econômicos. Fundada em 1910 por Théodore Schneider, a empresa teve uma trajetória vibrante, mas relativamente breve, deixando um legado de carros robustos e esportivos que rivalizaram com marcas como Bugatti em sua época.
Origens e Fundação
Théodore Schneider, nascido em 1864 no Rhône, França, de ascendência alsaciana, era um engenheiro experiente quando fundou a Th. Schneider. Antes disso, ele já havia deixado sua marca no setor automotivo ao co-fundar a Rochet-Schneider, em Lyon, em 1889, inicialmente focada na produção de bicicletas antes de se aventurar em automóveis a partir de 1894. Após desentendimentos, Schneider deixou a Rochet-Schneider em 1909 e, em 16 de junho de 1910, uniu forças com Louis Ravel, um engenheiro especializado em carburadores (fundador da Société du Carburateur Zénith), para criar a Société des Automobiles Th. Schneider, com sede em Besançon, na rua Fontaine-Argent. O nome ‘Th. Schneider’ foi escolhido para evitar confusão entre "Théodore" (seu nome de batismo) e ‘Théophile’, como era frequentemente chamado por amigos e parceiros.
A nova empresa foi estabelecida com a visão de produzir veículos robustos, confiáveis e voltados para o desempenho esportivo, aproveitando a experiência de Schneider e a paixão de Ravel pela competição. A equipe inicial incluiu o engenheiro Antoine Jaubert, o ex-diretor da Rochet-Schneider Louis Adenot e o representante Henri Juvanon, formando um grupo determinado a competir no crescente mercado automotivo francês.
Primeiros Anos e Ascensão
A Th. Schneider lançou seu primeiro modelo em 1911, um 10-12 HP com motor de 4 cilindros, transmissão por cardan com graxeamento automático e lubrificação por pressão. Este carro destacou-se imediatamente por sua confiabilidade, conquistando a medalha de ouro na corrida Londres-Edimburgo de 1911, ao rodar 26 horas sem parar o motor. O sucesso inicial foi consolidado com vitórias em corridas de montanha, como Limonest, Val-Suzon e Mont-Ventoux, o que ajudou a construir a reputação da marca.
Em 1912, a Th. Schneider entrou no cenário competitivo com força, participando de eventos como o Grand Prix da Bélgica, onde René Croquet venceu no circuito Anseremme-Dinant, e o Grand Prix de France des Voiturettes, no qual René Champoiseau, gerente comercial da empresa, terminou em segundo lugar. A empresa também desenvolveu um motor sem válvulas para o Grand Prix de Dieppe de 1912, notável por seu funcionamento silencioso e sem vibrações, embora nunca tenha sido comercializado.
A produção cresceu rapidamente, atingindo cerca de 300 veículos por ano em 1912. A Th. Schneider exportava para mercados como Inglaterra, Estados Unidos (via contatos de Louis Adenot em New York) e até Argentina, Espanha e Suíça. Para atender à demanda, a empresa abriu um atelier em Boulogne-sur-Seine em 1913, um polo da indústria automotiva, onde empregava trabalhadores qualificados. A gama de modelos incluía chassis com motores de 10 a 35 HP, vestidos por carroceiros conforme os desejos dos clientes, com opções de 4 e 6 cilindros, variando de 1.8 a 6.1 litros.
Primeira Guerra Mundial e Reestruturação
A Primeira Guerra Mundial interrompeu a produção de automóveis, forçando a Th. Schneider a fabricar ogivas, caminhões de 2 toneladas e veículos de ligação para o esforço de guerra. Após o conflito, a empresa enfrentou dificuldades para retomar a produção em grande escala. A fábrica de Boulogne-sur-Seine foi vendida, e o capital foi aberto a novos acionistas. Em 1919, no 15º Salão de Paris, a Th. Schneider apresentou quatro modelos com motores de 4 cilindros (2.3 a 5.5 litros), agora com radiadores frontais em V, alinhando-se às tendências da indústria francesa.
Apesar do sucesso inicial, a empresa enfrentou sua primeira falência em novembro de 1921, devido à incapacidade de competir com a produção em massa de gigantes como Citroën e Renault. Um concessionário de Lille assumiu o controle, permitindo a retomada das atividades em 1922. Durante os anos 1920, a Th. Schneider ampliou sua gama, com destaque para o modelo 10 HP, lançado em 1922, equipado com um motor de 1.947 cm³ (disponível em versões com válvulas laterais ou overhead para uso esportivo). Este modelo, com carroceria ‘Torpedo’, tornou-se um dos mais icônicos da marca, oferecido por 29.000 francos no Salão de Paris de 1924.
Auge nas Corridas
A Th. Schneider continuou a investir em competições, com resultados notáveis. Em 1926, um modelo 25 SP de 2.0 litros venceu a classe de 2.0 litros nas 24 Horas de Le Mans, pilotado por Tabourin e Lefranc, alcançando velocidades de até 140 km/h. A marca também ganhou notoriedade pelo envolvimento no famoso ‘White House crash’ em Le Mans, em 1927, ao lado de três Bentleys. Esses feitos reforçaram a imagem da Th. Schneider como uma fabricante de carros rápidos e confiáveis, embora seu conservadorismo técnico tenha limitado vitórias em eventos de maior prestígio, como o Grand Prix da França.
Declínio e Fim
Apesar dos sucessos, a Th. Schneider enfrentou dificuldades crescentes na década de 1920. A incapacidade de adotar a produção em massa, aliada à concorrência de marcas como Citroën, que ofereciam modelos mais acessíveis (como o Type B10), colocou a empresa em desvantagem. Louis Ravel deixou a Th. Schneider em 1922 para produzir seus próprios modelos, que também não resistiram à crise econômica de 1929. A empresa foi novamente declarada falida em 1929, encerrando a produção de automóveis no início de 1930. A falência final foi pronunciada em 1931, e o local da fábrica em Besançon hoje abriga a instituição Saint-Joseph.
A Th. Schneider produziu cerca de 300 veículos por ano em seu auge, mas hoje estima-se que apenas algumas dezenas sobrevivam, preservadas em museus como o Henri-Malartre, em Rochetaillée-sur-Saône, e coleções privadas na Inglaterra, Canadá e Espanha. Modelos notáveis incluem o 10 CV de 1926 (chassi nº 125) e o Le Mans Tourer 13/55 de 1926 (chassi nº 148). A marca é lembrada por sua dedicação à qualidade, robustez e desempenho, além de sua estética distinta, com radiadores de painel (dashboard radiators) até 1919, uma característica incomum para a época.
Théodore Schneider, cuja vida pessoal permanece envolta em mistério (não se sabe onde morreu ou foi sepultado), deixou um legado que, embora ofuscado por gigantes como Bugatti, reflete a ousadia de uma era de pioneirismo automotivo. A Th. Schneider permanece uma pérola esquecida, celebrada por entusiastas de carros clássicos e colecionadores que valorizam sua história de competição e elegância.